Textual
A
BELEZA MORRE
A beleza vive. A beleza
morre. A beleza que morreu desta vez chamava-se Marta Rocha.
Lembro-me de quando eu tinha
uns cinco anos de idade, em Guimarães, onde minha família residida. Na ocasião meu
avô, José Ribamar Ewerton, me fez decorar uma fala de sua autoria. Satisfeito
com meu rápido aprendizado, mandava me chamar onde eu estivesse para que a
repetisse para os amigos, quando acontecia de se reunirem num armazém defronte
à minha casa. Ele me estimulava: - Vamos
lá, rapaz, mostra para essa turma que você já sabe dizer o nome completo. Compenetrado,
eu repetia tintim por tintim o pequeno discurso que ele havia me ensinado e falava:
“Meu nome é José Ribamar Ewerton Neto, sou moço garoto da miss Brasil, Maria
José Cardoso, minha querida noiva”. Eles gargalhavam, encenavam me cumprimentar
como a um adulto e diziam: “Zé Ewerton, esse moço tem futuro, e já começa pela
Miss Brasil.”
Mais tarde tomei consciência,
através do que via nas fotos de revistas como O Cruzeiro, de que Maria José
Cardoso “a minha noiva”, era sim, muito bonita e, além disso, havia ganho o
concurso de Miss Brasil em 1956. Mas a beleza, a beleza de fato, não era ela,
mas Marta Rocha, que fora miss Brasil antes dela e cujos dons de formosura
capitalizaram o entusiasmo dos anos vindouros a ponto de seu nome se tornar um
sinônimo de beleza. Quando se dizia que fulana era Marta Rocha, as moças se
engrandeciam muito mais do que se alguém dissesse que eram formosas.
Confesso que para meu gosto
pessoal ainda embrionário, Marta Rocha era, sim, bonita, mas não abarcava toda a
gama de suscetibilidades estéticas trazidas, a seguir, por certas atrizes como
Sofia Loren, de quem me tornei ardoroso fã tão logo nos mudamos para a capital
e vim a conhecer o cinema. Era fatal que Marta, como ideário de beleza, fosse
sobrepujada por aquelas, cujas imagens se movimentando nas telas dos cinemas incorporavam
uma dose adicional de erotismo, sedução, e amor platônico, que uma fotografia solitária
era incapaz de sugerir. Dessa forma, Marta Rocha nunca foi páreo para a
italiana, que me fazia sair de casa célere em direção aos seus filmes, assistidos
muitas vezes à custa de burlar a idade mínima exigida.
Em paralelo, mesmo envelhecendo,
Marta Rocha continuou por muito tempo como símbolo da plenitude da beleza
brasileira. Afinal era possuidora da eterna beleza, como disse a seu respeito,
Vera Fisher, outra bela, em entrevista à rede Globo no dia de sua definitiva
ida.
Ao conceber o título desta
crônica em homenagem a essa mulher que obteve, como nenhuma outra, no Brasil, o
máximo que pode ser concedido à transitoriedade da beleza física, talvez haja
me inspirado no título do romance do japonês, Prêmio Nobel, Yasunari Kawabata
intitulado Beleza e Tristeza, no qual
o narrador ao mesmo tempo em que se rende ao esplendor da beleza, traduz-lhe a
precariedade diante da derrocada humana
Como disse Stendhal “A
beleza é apenas a promessa da felicidade”. Infelizmente, é ceifada pela morte também,
sendo, no entanto, suficiente para ter sido capaz de sobrepuja-la que, exuberantemente,
nos traga, como agora, toda essa conjugação de apogeu, melancolia e saudade.
José Ewerton Neto escreve às quintas-feiras para o Textual.
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