Textual

 DOS LIVROS SUPIMPAS

 

Quero, nesta oportunidade, partilhar três comentários, dois de orelha e um de quarta capa, sobre livros que fiz mais recentemente. As apreciações estão registradas a seguir e são sobre os livros de três maranhenses: A Episteme do Efêmero, de Ricardo Leão; O Sol da Palavra, de Silvana Meneses; As bodas de Sapequara, de Theotonio Fonseca. O livro de Ricardo já foi publicado, pela editora paulista Patuá (2020); os outros livros estão em processo de publicação.

 

(I)

Ricardo Leão em A Episteme do Efêmero confirma sua característica de escrita cônscia, de fôlego e pujança verbal. No núcleo das mensagens do livro, há a observação de que o tempo presente (em que parecemos estar perdidos de nossos companheiros) é época de fazer viver o sonho sem dormitar, de acordar o canto do galo e o tecido da aurora antes mesmo da imaginação do poeta. Tempo, principalmente, de salvar homens e crianças do salto dos seres rapinantes. Este Leão não se intimida diante das feras perigosas da estrada, inebria-nos num vasto campo de referências, apresentando sua voz límpida e própria. Explora formas e liberdades, manipula o idioma com maestria, oferta ao leitor uma literatura substancial, de um sangue que nos corta como um rio perene, sem contingenciamentos ou quaisquer artifícios de enganos. Livro atualíssimo e necessário, com uma forte veia crítica, com um sentimento do mundo que flui uma verdade latejante para além do efêmero e suas efemérides. É um livro que estilhaça conceitos simplistas. O autor desta obra é um dos maiores e melhores escritores dos dias de hoje, adverte-nos que “O verbo é o delito” de tudo quanto ele canta. Ricardo Leão não nos deixa descrer no tempo da poesia.

 

(II)

O astro-rei da poesia atravessou a janela e o olhar mais profundo de Silvana Meneses, abençoando-lhe os dedos criadores. Esta autora brasileira, com as raízes ligadas ao Maranhão, registra logo nas primeiras páginas deste novo álbum literário que “A palavra/ é lápide/ e lapidação.”. Lembrei de Déo Silva, o qual fala das funduras do verbo; senti-me, ainda, iluminado pela boca de Jandira que “era um disco vermelho/Tal qual um sol mirim”, conforme imaginou, um dia, Murilo Mendes. Observa-se na obra de Silvana os tons de uma metapoesia; um caráter anímico, em que a poeta se faz deusa e sopra nas narinas do poema e do sol um “acendimento de mundo”; a concisão e potência de sua (es)cultura do haicai; o domínio dos recursos estéticos da linguagem poética, algo que conquista com a leitura de um vasto campo de referências com que dialoga neste e em outros livros. Fiquei emoci(h)on(r)ado com a lâmina de um haicai a mim dedicado, tutanosa intertextualidade com o poema Soirée, de minha lavra, o qual dedico aos poetas Claudio Daniel e Paulo Leminski, possuindo Silvana certo afinamento literário com este último poeta referido, por isso a considero uma Onna-bugeisha do verso. Este livro é uma Silvan(a)urora de lâmpadas vivas de beleza. Há muito sou um apreciador das letras desta menina “Gonçalvina/parida em um balaio”, posto que sempre me chamou a atenção o alinhavamento consciente e luzidio da palavra que ela ensolara pelos caminhos.

 

(III)

Theotonio Fonseca é um bom nome das letras do Maranhão, com formação sólida e com alguma caminhada já realizada. Seu poema se apresenta com uma tônica corpulenta, dentro de uma poética de alto fôlego. Dialoga com a tradição, com o clássico, com a mitologia universal e bíblica, trazendo, por vezes, matizes de uma linguagem com sabor das raízes do chão natalício e, desse modo, nuances que tomam por empréstimo as cores das nossas aves.


Um conjunto de referências, de variado repertório, conflui nas camadas theotônicas do rio literário do bardo itapecuruense.  É prazeroso sentir, no seio deste novo livro, As bodas de Sapequara, uma evocação de elementos ancestres. Chamou-me a atenção, também, uma seção inteira de poemas que refletem sobre o processo misterioso de nascimento do texto poético, mas que vai além da simples metalinguagem no seu enredamento, assim notamos uma poesia com fome de infinito e que executa recitais para todas as plateias.

 

Carvalho Junior escreve às sextas-feiras para o Textual.

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