O AMANHÃ NÃO ME PROMETE
de Júlio César
I
Escrever, para mim, sempre foi muito triste.
De repente, lembrei que escrever
está debaixo da pele,
por entre os ossos,
é parte do sangue.
II
De noite, acordo e vejo você.
Ponho os óculos,
coço a cabeça,
vejo que horas são – não importa.
Te toco com a mesma mão
que construiu Constantinopla
e que versou Ilíada.
Tudo isso é tão ambíguo…
III
Só escrevo sonâmbulo.
Às vezes, acho que estou no fim,
Ou, talvez, seja o preâmbulo
da minha própria vida.
I
Preciso mostrar que é força,
isto que carrego nas veias.
Mostrar que meu vizinho,
depois de sua esposa ter morrido,
chorou tanto, chorou muito, chorou demais,
ficou magro e incapaz,
mas continuou sorrindo.
II
Escutei amante amado, do Jorge Ben, ontem à
noite.
Gostei tanto, mas tanto, e era tão bonita
que estou economizando as horas de
escutá-la,
para gastar contigo.
Agora já não sei se ela existe, ainda.
Conversamos sobre tudo:
Sobre a raça dos cachorros, os sotaques, as
brigas nos bares
e como o silêncio a dois premedita um
conforto profundo.
III
Procurei, mas não encontrei
um velho álbum de fotos,
que valeu e vale tanto,
por todos esses anos
que guardou a nossa história.
Por quanto tempo relembramos?
Hoje, o que tenho nas mãos
são alguns sonhos
e todos esses planos…
I
Você sabia
Que, no Maranhão,
milhares de pessoas esperam
o trem para levarem as
malas e os álbuns de foto
para qualquer lugar que não fosse aquele
em que cresceram e casaram e até mesmo
morreram de frio, de cólera, de desejo, de
desgosto,
ou de paixão?
II
Por esses dias,
tenho pensado que era eu quem me perseguia.
As palavras despistam, mas os livros não
dizem
que meu avô partia para nunca mais voltar.
É como viajar...
III
Todas essas palavras já foram escritas.
Penso se existem outras que ainda precisam
ser ditas.
Não acredito que serei eu quem as falará.
Por que será?
I, II, III
Em 2026, se estiver certo, completo 10 anos
escrevendo literatura. Comecei aos 12 anos. E, naquela época, quis acreditar
que ser um grande poeta me faria escapar do fardo de ser eu mesmo.
Durante um tempo, funcionou. Mas, olhando
para trás, percebo que essa ambição me fez tirar os olhos do que mais
importava. Estou feliz por não escrever. Escrever geralmente me faz ter
lembranças tristes ou pretender ser alguém que não existe, no final das contas.
Júlio César não existe. Só existe o Júlio,
filho da minha terra e filho dos meus pais, que não consegue imaginar o dia de
amanhã. O poeta não existe, somente o homem, e ainda acho que é exagero dizer
isso.
Na verdade, não sei por que estou
escrevendo esse texto... mas é interessante. Todo desconhecimento é uma forma
de descoberta.
Júlio César, 21, é poeta, produtor cultural, editor e revisor de obras e graduando em Jornalismo pela UFMA. Possui lançados os livros de poemas Quando as Baleias Choravam (2022) e Grandes Tragédias (2023).
Esse é o Júlio, grande, grande Júlio 👏👏👏👏
ResponderExcluirTe amo e te admiro tanto! és o meu escritor favorito.
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