DIA NACIONAL DAS COMUNICAÇÕES,
                     FAKE NEWS E A MAQUIAGEM DO CAOS 

O dia 5 de maio é considerado o Dia Nacional das Comunicações, data que se refere a uma homenagem ao Marechal Rondon, considerado o patrono das Comunicações no Brasil. Nos bons tempos da luta do Movimento Estudantil, início dos anos 1980 (milênio passado), havia no Campus da Universidade Federal do Maranhão (UFMA) uma estimulante mobilização em torno da busca pela liberdade de expressão, e a data se transformava num marco político. Combatia-se, então, a censura advinda do regime que amordaçou este país durante vários anos desde o Golpe Militar de 1964. Com os novos ares da abertura política, o país começou a arregaçar as mangas e a cobrar a liberdade expressiva, um alvo em permanente movimento, difícil de ser atingido, tanto em regimes de exceção quanto naqueles ditos democráticos.

Todo mundo sabe, desde criancinha, que os Meios de Comunicação de Massa, detentores do chamado Quarto Poder, nunca foram de fato democráticos. Manipulam dados, realizam filtragem de informação, descartando o que não lhes interessa e priorizando as notícias que se transformam em lucros para a empresa. Participam, às vezes explicitamente, do jogo sujo da politicagem de ocasião, servem ao capitalismo internacional e exercem até a censura, de acordo com suas conveniências, usando a devida maquiagem que esconde os meandros mais profundos da verdade que tanto se busca na comunicação séria, isenta. Alguns meios são mais complacentes com a verdade dos fatos, mas todos, no frigir dos ovos, acabam puxando a brasa para as suas próprias sardinhas. Os grandes meios de comunicação, no entanto, puxam a brasa não para as sardinhas, mas para os salmões importados e os bacalhaus comercializados a preços estratosféricos...

Aprende-se, ou pelo menos se deveria aprender nas escolas de comunicação social, a ética, a leitura crítica da informação, a visão metalinguística da própria comunicação, a redação escorreita, a fala disciplinada, fiel à língua culta padrão, a aceitação refinada dos novos discursos. Discute-se a ação dos movimentos sociais e a organização dos jornalistas, dentre outros pratos servidos pelos professores mais progressistas no cardápio curricular das nossas universidades tupiniquins. Estuda-se a Lei de Imprensa e, na letra rebuscada e afeita ao mundo jurídico, que permeia a Constituição da República Federativa do Brasil, lê-se, no artigo 5º, que é “livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independente de censura e licença”.

Armado até os tridentes, o animado “foca” (gíria para novato no Jornalismo) entra numa redação de jornal e um dinossauro o recebe para a primeira lição, repetindo uma frase que lhe empurraram goela adentro há zilhões de anos atrás: “esqueça de tudo o que lhe ensinaram na Universidade; aqui a realidade é outra”. Rasa realidade, pequena, mesquinha. Logo o aprendiz de feiticeiro entende que a censura existe, está ao alcance dos seus dedos que dedilham o teclado do computador e, com o passar dos anos, vai sendo domesticado cada vez mais, caso queira sobreviver nesse meio, afogando-se cotidianamente na mesmice de um texto falacioso, alimentado com ácidas gotas da cicuta da autocensura e do discurso fácil, sem profundidade, o que acaba por sepultar os resquícios de uma pretensa alvissareira vocação jornalística. Como diz uma querida amiga jornalista, “é o que há!”.

Ilusões jogadas para escanteio, o jornalista talhado para a profissão tem que comer o pão que o diabo amassou ao suportar os descalabros de sucessivos desgovernos medíocres (é duro aguentar o comando advindo da mediocridade) que tentam amordaçar a liberdade de expressão, às vezes disfarçando a censura através de discursos equivocados. Desde há muito que diversos governos tentam aprisionar os meios de comunicação, chegando até a ditar regras para o Cinema, interferindo nas informações a torto e a direito. Mas um dos problemas mais sérios e perigosos que se tem enfrentado ultimamente são as chamadas “fake news”, notícias falsas que manipulam as informações, provocando danos à nação, sobretudo em momentos de polarização política, eleitoral, o que influencia negativamente a opinião pública e causa avarias ao debate democrático. Existe uma frase polêmica, atribuída a Umberto Eco, que diz que “a Internet deu voz aos imbecis”, uma crítica à democratização da informação, onde se pode expressar quaisquer opiniões, mesmo que não tenham fundamentação, advindas de quem não tem discernimento ou expertise. Devidamente questionada a frase, o certo é que o espaço das redes sociais se abriu a tudo, à mentira, à maledicência, ao ódio, inclusive ao caos, à mediocridade.

No varejo, temos que engolir um cotidiano lixo televisivo, sofrer com a maioria das emissões radiofônicas abaixo da linha do razoável, e com um jornalismo impresso que deseduca a população. A violência de há muito se encontra disseminada nos meios de comunicação, bandido virou mocinho (os de colarinho branco ainda dão entrevista), a banalização da desgraça é um fato e a espetacularização da mediocridade aumenta a audiência, como se pode perceber com o sucesso de programas rasteiros como o Big Brother Brasil, no qual idiotas viram celebridade da noite para o dia, de acordo com as posturas mais absurdas que assumem no programa, alimentados pela torpe maquiagem da mídia.

No alvorecer do terceiro milênio, uma profunda e necessária discussão precisa orbitar o exercício dos Meios de Comunicação, visando fornecer uma contribuição ao país, sobretudo no processo de educação deste povo tão necessitado de luz. Senão, continuaremos navegando num abísmico e destrambelhado caos civilizatório.


 

Paulo Melo Sousa é poeta, jornalista, professor

e membro da Academia Ludovicense de Letras 

Comentários

  1. Crônica forte e atual! Paulo Melo relembra a luta por liberdade de expressão e denuncia como a mídia, ontem e hoje, manipula, censura e distorce a verdade. Ele critica desde os grandes jornais até as fake news nas redes, mostrando como tudo isso afeta a democracia. Um alerta necessário pra quem acredita na força da comunicação!

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  2. Curioso como chegamos a essa situação de hoje. Se um dia a liberdade de expressão foi a pauta daqueles que eram perseguidos e torturados por suas ideias, hoje é defendida por quem quer perseguir e torturar (ainda que simbolicamente). A lógica da extrema-direita é: "se não tenho o controle, vou atrapalhar".

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  3. Excelente texto, onde gregos e troianos fazem parte de um só saco de gatos, e a verdade clama pelo oxigênio existencial buscando a mão confortante da liberdade

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  4. Tem gente que está esquecendo que "o controle social da mídia" é um eufemismo para censura. E o autor da missiva esqueceu do ativismo judiciário, que é uma ditadura velada. Mas afinal Democracia quando não é a favor dos meus interesses, quando é contra, é Ditadura.
    Amém.

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  5. Você disse tudo num texto autêntico à função da comunicação como consciência sócio-profissional ao jornalismo. Parabéns!

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  6. Excelente texto Paulão, muito bem lembrado Rondon , suas conquistas, realizações notáveis e reconhecimento . E o dia Nacional das Comunicações.

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