A POÉTICA MUSICAL DE SÉRGIO HABIBE
Sérgio Habibe é um dos maiores poetas da música do Maranhão. Já
bastaria, para essa constatação, o início da sua música Solidão, onde
diz: “São raras as estrelas raras / mas a noite já vem / quem me garante que vai ser diferente”.
É um daqueles artistas que fazem da própria vida matéria-prima para a arte.
Suas canções são como janelas abertas para a cidade, para o mar e para os
silêncios que moram dentro de cada um de nós. Filho da lírica poética que
existe em São Luís, ele traduz, em acordes e palavras, aquilo que muitos
sentem, mas não conseguem nomear.
Habibe aprendeu cedo que a música não é só melodia, é espelho, é
porto, é travessia. E é curioso pensar que nem foi ele quem procurou a música;
foi ela que veio, puxando-o pela mão, como quem chama para uma caminhada sem
rumo, mas cheia de descobertas. Assim, ele seguiu, deixando que o som
desenhasse seus próprios caminhos.
O violão, primeiro desafinado, depois afinado pelo pai, foi a chave
que abriu portas para mundos que ele ainda nem imaginava. Cada nota, cada
acorde era também um passo rumo à própria identidade, construída entre o amor
pela cidade, pela cultura e pela natureza que cerca essa ilha, cercada de mar,
de memória e de encantamento.
Seus versos nascem do chão, da areia, da maresia, do cheiro de
peixe fresco e do som distante dos tambores. Mas também nascem desse silêncio
que mora entre um acorde e outro, daquele intervalo em que a vida para, respira
e se pergunta: e agora? São canções que abraçam quem anda meio perdido, quem,
no fundo, também se sente meio sozinho.
Quando se ouve Sérgio Habibe, percebe-se que não é só música. É um
convite à contemplação. É o som da cidade refletido nas águas, nas ladeiras,
nos quintais. É como se cada acorde dissesse: olha, respira, sente. A vida está
aqui, nesse detalhe que quase ninguém vê, mas que faz toda a diferença para
quem sabe escutar.
Mesmo com idas e vindas, com passagens pelo Rio, por palcos no
Brasil e fora dele, foi em São Luís que ele fincou suas raízes. Porque, no fim,
a cidade é mais que cenário, é personagem viva das suas músicas. É nela que
ele se encontra, se perde, se zanga, mas também é nela que ele sempre volta,
como quem volta para casa depois de uma longa viagem.
E é bonito pensar que, aos 70 anos, ele segue. Com a mesma chama
acesa, com a mesma inquietação de quem sabe que a vida não cabe em um único
acorde, nem em uma única canção. Ainda há muito o que compor, muito o que
dizer. Porque, enquanto houver silêncio, haverá alguém disposto a preenchê-lo
com som, poesia e sentido.
Sérgio Habibe, o poeta da música maranhense
Sérgio sabe que não há pressa na arte. Que as melhores músicas nascem no tempo certo, como frutos que só amadurecem quando o sol e a chuva decidem que é hora. E talvez seja justamente isso que faz sua obra ser tão cheia de beleza, de verdade e de humanidade.
Basta lembrar de músicas como “Panaquatira”, que carrega o
cheiro da praia e a simplicidade dos encontros que o tempo não apaga. Ou “Ponteira”,
que é quase um retrato da cidade, uma fotografia em forma de melodia, onde cada
verso carrega um pedaço da história de quem vive ali, à beira das marés e dos
ventos.
Tem ainda “Dia de Será”, essa espécie de oração feita de
perguntas, incertezas e esperança. Uma música que fala sobre aquele sentimento
que todo mundo conhece, de esperar algo que não se sabe bem o que é, mas que
se deseja com toda a alma. E, claro, “Eulália”, que se tornou não só um
clássico, mas também uma espécie de hino afetivo para quem entende que a vida é
movimento, fuga, resistência e amor.
A obra de Habibe é uma cartografia emocional do Maranhão. Seus
acordes mapeiam não só os lugares, mas os sentimentos, os silêncios, os afetos
e as memórias de um povo inteiro. E ouvir suas músicas é, de certa forma,
lembrar que, apesar dos pesares, ainda vale a pena seguir. Porque, sim, “são
raras as estrelas raras”, mas é exatamente por isso que seguimos nessa trilha
poético-musical de Sérgio Habibe.
Bioque Mesito é poeta, autor de cinco livros
de poemas publicados
Excelente!
ResponderExcluirSérgio Habibe é um gigante do nosso cancioneiro popular. Uma honra para todos nós pertencermos à mesma geração desse músico brilhante e criativo.
ResponderExcluirExcelente matéria sobre este magnífico artista da música. Suas canções são incríveis, bastantes reflexivas. Parabéns pelo texto poeta escritor Bioque Mesito.
ResponderExcluirObrigado, meu irmão!
Excluir👏👏👏👏👏👏
ResponderExcluirBelo texto do Bioque, cheio de poesia, colocando o artista Sérgio Habibe em seu devido lugar dentro da música brasileira.Parabens.
ResponderExcluirObrigado, meu amigo.
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