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“LIVES”, “LIVES”, “LIVES”...

 

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, mudam-se os costumes... “Nada do que foi será, de novo do jeito que já foi um dia. Tudo passa, tudo sempre passará”...

Os tempos passaram de modo célere nos últimos meses. Deitamo-nos em um momento histórico e despertamos em outro que se assemelha a um filme de ficção científica, no qual todos usam máscaras, os abraços e apertos de mãos tornaram-se fonte constante de perigo e de ameaça à saúde da população... Ainda não sabemos as consequências disso, mas não há dúvida de que os refluxos virão...

Enquanto eles não chegam, vamos, hora a hora, aprendendo a conviver com as novas (a)normalidades que começam a fazer parte de nossa vida.

Uma dessas novidades é a presença das transmissões ao vivo pela internet, as famosas “lives”. Interessante notar como as percepções se alteram de acordo com as necessidades e com as conveniências prementes: um dia, a grande rede de computadores é acusada de separar as pessoas e de tornar as relações pessoais mais mecânicas e menos afetuosa. Dias depois, ela é vista como a ferramenta ideal para aproximar as pessoas que tiveram de conviver com o um isolamento forçados pelas circunstâncias pandêmicas.

De um dia para o outro, em horários estrategicamente determinados, aplicativos e redes sociais tornaram-se grandes janelas de compartilhamento de conhecimento, entretenimento e até mesmo do chamado besteirol. Mas, nessas novas eras, tudo pode ser muito válido. O que é bobagem para uns, pode ser interessantíssimo para outro grupo. Da mesma forma, informações técnicas, científicas e/ou acadêmicas que podem fazer alguns olhos brilharem, podem ser classificados como maçantes para quem apenas deseja “passar o tempo”, sem compromissos formais.

Para tentar amenizar essa situação, algumas pessoas começaram a utilizar plataformas específicas, em cujas salas se reúnem pessoas que têm objetivos e interesses afins. Mas isso não impediu a grandiosa proliferação de “lives” sobre todos os assuntos, algumas anunciadas com antecedência e outras cujos temas só são anunciados quando a transmissão é iniciada.

Quase sempre, abrir uma “live” equivale a deixar uma janela (ou pelo menos uma fresta dela) aberta para que os transeuntes possam verificar o que tem ali dentro. Se o conteúdo não interessa, o visitante, sem a menor cerimônia ou remorso, parte para outra. Quando tem afinidade, com o que é apresentado, a pessoa se abanca e aproveita tanto as informações, quanto a companhia daqueles que ali estão, de forma ostensiva ou em uma discreta timidez.

Em alguns casos, a rígida e implacável norma estabelecida de uma hora exata para cada apresentação deixa no ar o sabor de “quero-mais”, em outras, essa limitação é um grande alívio.

Mas o que se aprende em uma “live”. Há quem acredite que se trate de um tempo desperdiçado, de coisa de quem nada tem para fazer. Não vejo assim... Vejo como uma oportunidade de democratização tanto do ato de aprender quanto da ação de ensinar. Tais transmissões ao vivo mostraram que todos nós temos algo para mostrar ou para ensinar e que sempre haverá quem sinta a necessidade de interagir com as demais pessoas que comungam dos mesmos gostos e afinidades.

Para quem gosta de aprender, as “lives” podem propiciar ótimas oportunidades de entrar em discussões sobre livros, filmes, peças, autores etc. E, ainda por cima, talvez surja a oportunidade de ter diante de si, aquele artista, professor, palestrante, influenciador... que você tanto admira bem ali na sua frente, doando um pouco de seu tempo para pessoas que muitas vezes se encontram do outro lado do mundo.

Nas “lives” é possível encontrar temas que vão desde a discussão da conjuntura política atual até a vida sexual das formigas africanas. Cabe a cada um de nós filtrar o que nos interessa, agradecer a quem disponibiliza seu tempo e sua energia para que tenhamos bons momentos de interação e, principalmente, respeitar até mesmo quem considere que em uma “live” perdemos nosso tempo.

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, mudam-se os costumes... Então, caso não goste, não custa também mudar de “live” e deixar o tempo correr, pois, “tudo passa, tudo passará e nada fica, nada ficará”.

 

José Neres escreve às segundas-feiras para o Textual.


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