Conversas vadias
CONVERSANDO SOBRE A ORDEM... E AS 7 ESTAÇÕES DA VIDA*
Luís Augusto Guterres é um
colecionador de amigos e de títulos, portanto, um homem de sucesso. Recebi dele
um dia destes, com elegantes dedicatórias, os livros ‘Conversando sobre a Ordem
dos Advogados do Brasil e outros ensaios’ e ‘As 7 Estações da Vida’; no
primeiro, José Antônio Almeida, presidente honorário e vitalício da OAB [Seção
do Maranhão] diz na contracapa, em excerto retirado do prefácio, que “há textos
que revelam não mais o advogado, e sim o poeta e/ou o crítico literário
GUTERRES: assim quando aborda ele as recentes contribuições de maranhenses às
letras... com as publicações de vários livros na nossa Athenas Brasileira, ou
quando, emotivo, recorda a nossa velha Faculdade de Direito da Rua do Sol.”
Este livro de Luís Guterres
é um intenso trabalho enfeixado de crônicas, artigos e ensaios lítero-jurídicos,
como Advocacia e Solidariedade; Letras Jurídicas Maranhenses; Flagelo
Penitenciário; Impessoalidade e Discrição; Clodomir Cardoso e o Centenário da Faculdade
de Direito do Maranhão; quase todos
publicados no jornal ‘O Estado do Maranhão’, e mais, Discurso de posse na
Academia Maranhense de Letras Jurídicas, dele, do poeta e advogado Luís Augusto
Guterres ao tomar assento na Cadeira nº 15 daquele sodalício, patroneada por
Cândido Mendes de Almeida, e vaga com o falecimento do seu fundador, o nosso
querido e saudoso Desembargador José Antônio de Almeida Silva. É um discurso
brilhante e técnico à altura dos dois homenageados. No livro, há, ainda, questões
de ordens que balizam e bem dizem dos quefazeres da Instituição [Seccional do
Maranhão], enfeixados numa bela capa a reproduzir tela de Rogério Martins, cujo
motivo é uma janela de sacada a ferro, aberta para o tempo, a nos fazer lembrar
os seculares e silentes sobrados do Bairro Alto, ou da Alfama, em Lisboa, ou
ainda, da Rua da Palma, ou do Desterro, em São Luís do Maranhão.
As múltiplas variações de
textos contidos neste livro de Luís Augusto Guterres me açoitam de saudade e
recordações, e me transportam à década de 70, à minha turma de bacharéis da
Faculdade de Direito do Distrito Federal [Centro de Ensino Universitário de
Brasília], paraninfada pelo Civilista Moacyr Amaral Santos e pontilhada de
lembranças de alguns mestres, como André Franco Montoro, Luis Vicente
Cernicchiaro, Francisco de Assis Barbosa, Geraldo Vieira, dentre outros
luminares do Direito, a quem sou reconhecidamente grato pelas muitas
informações à minha formação que já se alonga no tempo... bem assim como as
lembranças de quando adentrei aos quadros profissionais da Ordem dos Advogados
do Brasil, Seção do Distrito Federal, há quase cinquenta anos, sob à unção do querido
professor Roberto Lyra Filho, um dos maiores penalistas brasileiros, quando era
presidente da Instituição, o Jurista Mauricio Corrêa, depois ministro do Supremo
Tribunal Federal.
O outro livro de Luís
Augusto Guterres que me chegou juntamente com o que acabo de apostilar,
trata-se de ‘As 7 Estações da Vida’, este de poemas, com endosso de dois dos
mais legítimos analistas literários do Maranhão, Nauro Machado e Albérico
Carneiro. O primeiro, diz ser “este livro de poemas curtos, axiomáticos quase
sempre sem redundâncias vocabulares, sem escoras de rimas ou mesmos sem aquela
música a ocultar-se na própria pausa ou no silêncio invertido de um pensamento
metafísico, súmula do agonismo eliotiano, essa estreia de Luís Guterres nas
letras maranhenses, marcará sem dúvida um ponto positivo nesta hora de
perplexidade e engodos fáceis.” Já Albérico conclui sua assertiva em dizendo
que “seus poemas são mosaicos monolíticos às vezes, contextuais, principalmente
quando sequenciamos os eróticos, em que, parece, se concentra grande parcela de
sua criatividade, como fruto de vivência, experiência. Autobiográficos, eles
nos passam, com bastante dosagem de existencialismo e de uma eroticidade de
quem aprende a arte de amadurecer e sazonar.
Como bom advogado, Luis
Guterres no poema ‘Embargos de declaração’ sabe perfeitamente que esse tipo de recurso não modifica decisões,
vez que é um viés tipicamente protelatório, mas como poeta, apela para os
vícios ficados naquela estranha dúvida, a insistir pelos vãos da omissão, da obscuridade
e da contradição, na esperança de encontrar, talvez, um sorriso... e, ao se
fazer de desentendido, se legitima ao amor, ao desejo e à paixão da amada...
Neste livro, o cimo da
poemática de Guterres se eleva nos poemas eróticos, como bem disse Albérico
Carneiro. Ouçamo-lo neste, ‘Múltiplos orgasmos’, onde o poeta canta: “ Às vezes
me confundo/ outras nem acredito mas,/ sempre és a mesma/ ou será natural das mulheres/ que igual a ti se metamorfoseiam,/
possuir múltiplas faces/ para o mesmo espelho./ E sempre que refletes,/tu
renasces, te transforma e me deslumbras,/ ao não me deixares saber/ se é
realmente contigo que me deito/ pois, na vastidão da cama/ onde nunca te
repetes, e em ocasiões me desconheces...”
O cenário do poeta é dantesco, o céu, evidentemente, e a linguagem do
poema, mesmo instintiva e universal, é definitivamente petrarqueana, já que na
luxúria o poeta parece juntar-se às diabruras de Bandello e Boccaccio.
Escutemo-lo, por fim: “...é difícil prever o que me espera, / se a pantera
sensual e eterna/ ou, a mulher casta e materna. / E com tudo é privilégio/
possuir em uma única / todas as mulheres”.
Neste livro há tudo de bom
como vimos, inclusive estas dualidades metafísicas: “Eu vi a vida ante a visão
da morte...” Ou, um subjetivismo para além dos muros do adeus: “...os bondes
besouros negros, ferem a chuva, estridentes e cheios...” Ou, por fim e definitivamente:
“Quem quiser conhecer São Luís que me visite, percorra as cicatrizes de minha
alma...”
Este é o poeta e advogado Luís Augusto
Guterres estreante no ‘Pantheon das Letras do Maranhão’, com estes poemas
enfeixados em ‘As 7 Estações da Vida’, oferecidos a vários dos seus amigos
queridos, inclusive a Joaquim Itapary que não é só o conselheiro de todas as
horas, como diz Luis Guterres, mas um homem de cultura feita, um escritor
brilhante, a quem, particularmente, devoto um terno e fraternal amor.
A capa do livro é de Péricles Rocha; e a
evocação, no frontispício, é um aforismo do poeta simbolista francês Paul
Valéry: “...em poesia, trata-se antes de mais nada, de fazer música com a
própria dor...”
E assim é, se lhe parece!
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*Fernando
Braga, in ‘Conversas Vadias’, antologia de textos do autor.
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