Textual
QUANDO UM AMIGO PARTE
(Agosto
2016)
Quando um amigo parte, ficamos menores porque ele
leva consigo um pedaço da nossa história. Deixa conosco as lembranças dos
momentos vividos ou enfrentados juntos, as alegrias compartilhadas e a falta de
sua presença física. Não apenas os amigos estão faltos da presença de Jomar
Moraes; o Maranhão também perdeu um grande historiador, crítico literário, ensaísta,
pesquisador, editor e bibliófilo. Editor
por excelência, Jomar tomou para si a tarefa hercúlea, e trabalhou nela mouramente,
de resgatar a memória da valorosa produção literária maranhense esquecida ou
abandonada na poeira do tempo, à espera de quem tivesse a coragem de espaná-la.
Outro grande projeto realizado foram as reedições, enriquecidas de notas, dos
poemas de Sousândade, do Dicionário Histórico-Geográfico da Província do
Maranhão, de César Marques, das obras completas de João Lisboa e de toda uma
plêiade de autores fundadores que ele arrancou da ameaça do esquecimento,
promovendo edições e mais edições de suas obras, até pô-las ao alcance de todos.
Difícil será substituí-lo na tarefa de reedificar os pilares da literatura
maranhense.
Na Academia Maranhense de Letras, onde ingressou em
10 de maio de 1969, ocupando a Cadeira nº 10, sucedendo a Henrique Costa
Fernandes, foi decano e presidente por 23 anos. Na sua gestão, promoveu uma
reforma física e administrativa da AML, alevantando a instituição que passava
por um período de apatia. Foi, mesmo na sua doença, um dos seus membros mais
atuantes. A Academia Maranhense de Letras apequenou-se com a sua perda.
O prazer genuíno de dividir o saber lhe criou
numerosos, incontáveis discípulos e parceiros. Dúvidas sobre história, escritores e obras
maranhenses de todos os tempos, tiravam-se com Jomar Moraes, dono de uma erudição
e memória prodigiosas as quais conservou até o último lampejo.
Repartia o conhecimento, aconselhava os jovens,
tornava pública a sua biblioteca privada – talvez a maior biblioteca privada
maranhense – indicava fontes, dirimia dúvidas. Perdemos um pesquisador que emulava outros
pesquisadores. Aos domingos, tínhamos pequenas reuniões na sua biblioteca, que
foram apelidadas de “Jomingos”, inesquecíveis saraus literários.
A porta de sua casa era sempre aberta para todos,
estudantes, poetas, acadêmicos, escritores principiantes. Não precisava marcar.
A gente ia entrando e Aldenir dizia: está na biblioteca. Era só subir a escada
de madeira e lá estava ele sentado em sua cadeira de couro em frente à sua velha máquina de escrever. Nunca
usou computador.
A literatura maranhense ficou substancialmente mais pobre. Uma leva
de grandes poetas, prosadores, historiadores, ensaístas, intelectuais
completos, da AML, desses que não se costuma ver todos os dias, partiram nos
últimos anos. Josué Montelo, Mário Meireles, José Chagas, Nauro Machado, Carlos
de Lima e agora Jomar Moraes. Quais os substituirão?
Jomar Moraes foi menino da baixada de Guimarães e
de outros municípios, aonde o levava o périplo empreendido pelo seu inquieto
genitor. Primogênito, com a morte prematura do pai, tornou-se o esteio de uma
numerosa família de sete irmãos. Orientados
por ele, tomaram seguros seus rumos na vida.
Sem recursos para manter-se, torna-se soldado de
polícia, fato que nunca escondeu e de que se orgulhava. Autodidata, leu tudo que pôde encontrar sobre
o Maranhão. Mais adiante, formou-se em Direito e realizou vários cursos de especialização, na idade
madura, realiza a sua paixão maior, faz o Mestrado em História. Cursos que só
vieram a dar chancela acadêmica ao que o grande pesquisador maranhense já dominava.
Jomar Moraes formou sua família com Aldenir, seu porto seguro, a
mulher que tomou para si o cuidado doméstico e os problemas familiares para que
Jomar pudesse dedicar-se à sua paixão pela literatura.
Outra grande mulher, sua filha Júlia Esmeralda,
amorosamente, cuidou e vigiou sua saúde pelos dez anos de sua doença, até o seu
último momento. Louvores a Jomar Moraes
pelo grande legado literário e cultural a nós deixado. Louvores a estas duas
mulheres pelo muito que souberam amar.
Ceres
Costa Fernandes escreve às
quartas-feiras para o Textual.
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